quinta-feira, 4 de agosto de 2022

Quão bom é suficiente para estar bem?

 

https://drive.google.com/uc?export=view&id=1fXzi6aKZCWTT6Gug6Tbb2WWlfnjWND7E



Toda semana, passo por uma residência bem peculiar, difícil não reparar naquele lar. Ela me faz pensar muito nisso que chamamos de bem estar.  

É um contexto que, a maioria de nós, enxerga como miserável. Porém, não é isso que a cena me transmite.  

Trata-se de alguém que vive em uma barraca de acampamento em uma calçada pública, ou seja, uma pessoa em situação de rua.  Mas o que me chama atenção é o zelo que o habitante daquele lar tem com seu ambiente. A barraca é decorada com adornos e flores.  Está sempre limpo ao redor.  A cada semana parece que tem um detalhe novo ou um rearranjo na disposição dos objetos. Nitidamente, a pessoa que ali habita cuida do seu habitat.  

A gente é condicionado a pensar que o bem-estar está associado à conquistas materiais: emprego, casa, carro, viagens etc. Quanto mais, melhor. 

Até mesmo as relações são construídas e mantidas de forma a ostentar um padrão de felicidade. 

Não quero romantizar a miséria nem a solidão,  mas será que isso tudo é realmente o que garante nossa satisfação pessoal? 

Toda vez que vejo essa moradia eu penso que deve haver muita gente vivendo em casas luxuosas se sentindo mais miserável do que aquela pessoa. 

Sempre me lembro de um outro morador de rua que conheci há anos. Ele me disse que escolheu morar na rua, pois a família dele não o aceitava porque ele era alcoólatra. Então ele preferiu deixar tudo: casa, emprego, família e morar na rua. Ele me disse que vivia melhor ali, apesar do desconforto físico, não tinha que lidar com a cobrança e pressão familiar e sentia respeitado. Era uma pessoa inteligente, agradável para conversar. Chegou a me dar dicas de carreira.   

Mas eu u não conseguia entender. Nessa época, eu trabalhava e estudava. Sonhava em entrar na universidade, conquistar alguma coisa na vida e ter um mínimo de segurança sócio-econômica. Então, não fazia nenhum sentido para mim alguém que teve tudo isso e resolveu largar tudo.  

Mas hoje eu consigo entender um pouco melhor. 

A gente vive, quase sempre, de modo automático. Sempre correndo atrás de algo que parece inalcançável. Se temos um emprego, questionamos se há outro melhor; se temos casa, queremos uma maior ou mais sofisticada; se podemos viajar, parece que sempre podia ter sido mais bem aproveitada. E assim seguimos, correndo, lutando, se comparando e sempre se sentindo incompleto, constantemente com a sensação de tudo que temos nunca é  suficiente, sempre  falta algo. 

Mas que algo é esse? 

Eu não acredito que é preciso viver sem um mínimo de conforto. Pelo contrário, penso que  todos deveriam ter condições básicas de subsistência e serem tratados com a mesma dignidade e respeito.  

Quando penso sobre isso, me lembro da pirâmide de Maslow (recentemente descobri que ele não desenhou pirâmide nenhuma, mas a ideia é dele). 

https://drive.google.com/uc?export=view&id=1_2uEedgzlJ8Nq4s9t4UJaKLKrR_tjF7M
Pirâmide de Maslow


É uma ilustração muito clara sobre as necessidades e desenvolvimento humano. Para nos ocupar de coisas além da sobrevivência, é preciso primeiro atender aspectos básicos como:  necessidades fisiológicas, físicas etc. Só com um mínimo de dignidade podemos nos dedicar a questões mais profundas relacionadas à natureza humana.  

Porém, a maioria de nós vive aquém desse mínimo. E pior, mesmo quando conseguimos escalar alguns níveis da pirâmide, raramente nos contentamos. Somos instigados a procurar sempre fora o preenchimento para o vazio interno. 

As pessoas que se dedicam mais às questões que estão no topo da pirâmide de Maslow costumam ser guias para uma multidão que quase nunca consegue chegar lá, pois não sabe exatamente o que está fazendo, apenas segue o líder em busca de algo que parece necessário, mas sem clareza do que é exatamente. 

Então, passamos a vida como um burro correndo atrás de uma cenoura que está presa à sua cabeça. Por mais que ele corra, nunca vai alcançá-la. 

Aí eu penso nessas pessoas que abrem mão do status de bem sucedido, da recompensa por suas conquistas e parecem viver em paz.  Imagino que não é uma escolha fácil.  E o processo para chegar ao ponto até tomar essa decisão deve ser árduo, mas parece libertador. 

É uma escolha muito radical. Mas, talvez, entre uma vida internamente miserável, mas socialmente bem sucedida, seja mais gratificante viver em paz, ainda que  sem benesses materiais. 

Mas será que é preciso optar entre uma coisa ou outra? Será possível usufruir de conforto e comodidades materiais, mas também se sentir plenamente realizada? 

Acho que a resposta para essa questão começa pelo auto conhecimento. Precisamos saber o que nos motiva, o que nos alegra e aquilo que é essencial para nos sentirmos em paz. Talvez o caminho deva passar por aplicarmos mais nossos recursos no que faz sentido para nós, ao invés de acumular coisas e experiências para sustentar o status de bem sucedido. 

Quem sabe é possível encontrar o equilíbrio entre o que precisamos, o que somos e o que queremos. Mas para isso é preciso se libertar de algumas ideias impostas e ter consciência do nosso lugar no mundo. 

Mas não existe resposta única, tampouco uma fórmula universal para encontrar o caminho. Cada um é responsável por encontrar-se e escolher por onde e como caminhar pela vida.